quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Godofredo

Ricardo:  Cientificamente falando, é quase certeza que o universo não é eterno. A teoria do Big Bang e a segunda lei da termodinâmica refutam essa ideia.

Chris: Isso. Eu tava assistindo um documentário sobre o assunto e defendiam essa ideia mesmo, de que o universo teve um início. 

Ricardo: São poucos hoje que defendem o contrário. A cosmologia atual sugere isso pra caramba.

Godofredo: O negócio é que a evidência cientifica é falseável, então talvez tudo isso possa estar errado.

Ricardo: É verdade, mas não tem motivo pra desconfiar das teorias hoje. Elas funcionam.

William: Além disso, a evidência cientifica não seria tudo pra defender esse ponto de vista. Acho que filosoficamente isso pode ser provado também.  

Chris: Geralmente  eu não ia ligar pra isso, mas fiquei interessada. Aquela conversa de vocês sobre filosofia foi legal.

Ricardo: Eu estava num dia ruim...

William: Claro, hehehe.

Godofredo: Um motivo que me veio na cabeça uma vez é esse: antes de hoje teve o ontem e antes do ontem teve outro dia. Se o universo não teve um começo, então antes de qualquer dia começar teria que ter um outro dia, eternamente.

William: Isso. Então nunca teria o hoje, já que o ontem apareceria antes e antes dele um dia teria que aparecer, sem parar. De forma que antes de hoje teria que se ter um número infinito de dias.  

Chris: Que doido, haha.

William: Outro problema é que o número de dias seria infinito, o que também não daria certo, já que o infinito mesmo não existe.

Ricardo: Mas o número de números não é infinito?

Godofredo: Potencialmente ele é. Mas o infinito mesmo gera contradições. Tipo, se você fizesse infinitas camas e chegasse um número infinito de pessoas pra dormir nelas, ainda sobraria espaço pro dobro de pessoas, já que as camas são infinitas. Isso seria bizonho, hahaha.

William: Você podia botar um número infinito de pessoas nas camas que o número de camas vazias ia continuar igual...

Chris: Isso seria estranho...

Ricardo: Seria impossível. Mas é legal ver então que um conhecimento confirma o outro.

Godofredo: Isso levanta uma questão: Por qual motivo existe algo e não o nada? Se o universo começou,  o que o fez nascer dessa forma e não de outra?

Ricardo: E pra que o universo precisaria de algo mais?

Godofredo:  Se o universo começou, então a existência dele não é necessária, já que ele podia ter começado em outra hora ou de outro jeito. O que não é necessário precisa de outra coisa pra começar a existir.

Chris: Então você acha que o universo precisa de uma explicação pro motivo dele existir do jeito que é?

Godofredo: Dele existir em geral. Como ele começou, tem que ter um motivo pra ele existir. O universo existir dessa forma também é estranho.

Chris: Então você acha que o universo não é necessário? Por isso ele precisa de uma causa?

Godofredo: Isso. O que podia existir de outro jeito ou não existir não é necessário. E só o que é necessário é explicado pela sua própria natureza. 

Ricardo: Como assim?

Godofredo: Bom, tudo que existe tem uma explicação, seja pela sua própria natureza ou por outra coisa. O universo é  do segundo tipo, então precisa de algo mais pra explicar como o universo existe dessa forma ou sequer existe.

Ricardo: Talvez essa configuração  do universo seja necessária. Não tem como saber.

Chris: Deve ser isso mesmo.

William: Mas o universo começou. Se essa configuração fosse necessária então ela devia existir sempre. 

Godofredo: Fora que o universo poderia ser diferente. Se ele tem essa forma e não outra, precisa de um motivo.

Ricardo:  E o que explica essa explicação? 

William: Ela precisa ser necessária, já que se não fosse então ela ia precisar de outra coisa pra existir. 

Chris: Algo necessário seria tipo dois mais dois é igual a quatro? Acho que isso se explica sozinho se você parar pra pensar.

William: Algo assim, acho. Não tem como essa conta ser diferente ou deixar de ser verdade, então é algo necessário.

Chris: Isso faz sentido...

Godofredo: Isso. Então  a causa do universo seria algo eterno e necessário. Teria que ser imaterial também, já que explica a matéria.

William: Teria que ser fora do tempo também, já que o tempo nasceu junto com o universo.

Chris: Teria que ser algo beeem forte também pra poder criar tudo.

Ricardo: Vai ver não tem explicação.  Talvez o universo exista sem motivo.

Godofredo: Mas tudo que não é  necessário precisa de uma explicação de fora. Não tem exceção. 

Ricardo: O fato das coisas do mundo terem uma explicação não  significa que ele tem. É  como dizer que o meu carro é  de borracha pois um pedaço  dele é. 

Godofredo: Mas um muro feito de tijolos azuis é  azul. Será que existência  é  como o exemplo do carro ou como esse do tijolo?

William: Bom, uma peça de lego é  necessária?

Chris: Não, né.

William: Eu ir juntando peças ia gerar algo necessário eventualmente?

Chris: Não. Ia continuar sem existir necessariamente.

William: Nesse caso, o universo também  não é necessário.

Ricardo: Mas ainda acho que pode simplesmente não  ter causa.

Godofredo: Que desespero estranho da tua parte, hehe. Isso acabaria com todo  conhecimento científico.

Ricardo: De que forma?

Chris: Acho que é  que ai as coisas poderiam não  ter explicação, sendo que a ciência busca justamente isso.

Godofredo: Isso! Se algo pode não  ter explicação, talvez os efeitos que acham que a gravidade causa não tem explicação  real e a gravidade não existe. Vai ver os fósseis de dinossauro também existem sem motivo e os grandões nunca existiram...

Ricardo: Realmente, se algo torna a ciência  tão pouco confiável, então deve ser uma questão de probabilidade. No geral deve tudo seguir uma ordem e só  não ter explicação  em casos  como o universo.

Chris: Como teria probabilidade  se é  algo sem explicação? Probabilidade  precisa de ordem. Não  só  a ciência estaria perdida, mas não  existiria ordem nas nossas mentes.

Ricardo: Como assim? Nossas mentes estão sem problemas.

Godofredo: Acho que ela tá  dizendo que suas ideias podiam aparecer sem motivo. Então, se não bastava não ter ciência, nem seus pensamentos iam ser confiáveis.

Chris: Por aí. O universo e as nossas mentes tem ordem, então não pode existir essas coisas sem explicação.

William: Acho que está provado mesmo, já que a ordem é real. Então o universo tem uma causa.

Ricardo: Talvez seja o multiverso então. É  claro! Tinha me esquecido.

William: Já pensei nessa ideia, mas ela me assusta. Não seria possível que exista um universo onde só  tem um cérebro que pensa que vê um mundo real?

Ricardo: Seria. Deve ter infinitos universos assim.

William: E como você sabe que não é  um cérebro assim?

Chris: Nossa! Pior que é mesmo. Não ia dar pra saber. Que medo...

William: Não ia ter como garantir que o mundo que você vê é real se o multiverso existe. Isso me assusta.

Ricardo: Preocupa mesmo. Mas é  a melhor explicação, então é o jeito.

Godofredo: Será que é mesmo? Mas como esse multiverso seria?

Chris: Pode ser tipo nos quadrinhos da Marvel e da DC, onde todos os universos existem ao mesmo tempo.

Ricardo: Isso seria bom, já que ai não ia precisar de um motivo pra esse universo existir dessa forma que ele é e não outra. 

Godofredo: Como assim?

Ricardo: Se você chega em casa e tem um sorvete de morango, precisa de um motivo pra ele ser de morango e não de maracujá. Mas se todos os sabores estão lá, essa dificuldade some, hehehe.

Chris: Não fala disso não! Que vontade de ter um sorvete agora...

Godofredo: Deu fome mesmo, mas isso não resolve o problema, já que você ainda precisa de um motivo pra ter todos os sorvetes e não três, ou nenhum. Na verdade, como cada universo precisa de uma explicação, você só piorou o problema!

Ricardo: É verdade, haha. Fazer o que. 

William: Outro problema é que a causa do multiverso é eterna. Se ela gera os universos, eles deveriam ser eternos, o que não é o caso.

Chris: Como assim? 

William: Pensa no fogo. Sempre que o fogo existe ele gera calor, pois ele não pode escolher gerar calor ou não. Se a causa do multiverso é eterna e não pode escolher gerar os universos, então eles são eternos, já que ela  sempre vai causar eles.

Chris: Nesse caso, ou ela escolheu gerar os multiversos ou esse multiverso não existe. Putz! Achei que tinha acertado.

Godofredo: Acontece.

Ricardo: Talvez então  o multiverso seja assim: existe um universo de cada vez e um novo universo surge após o fim de outro, infinitamente. Tem algo assim nas religiões da Índia  e em algumas hipóteses científicas. Assim não precisaria ter um começo pra existência, mas também nenhum universo teria existido infinitamente.

Chris: Mas isso não cai naquele problema do infinito? Se o número de universos é infinito e cada um deles nasce depois de outro, então antes de um universo existir vem outro, e antes desse vem outro, e antes desse vem outro, e antes desse vem outro, eternamente.

Ricardo: Então nenhum universo poderia nascer, já que infinitos universos precisariam vir antes. Faz sentido. Talvez o número deles seja finito então.

William: Se for o caso, o que explica a ordem deles? Algum  motivo tem que existir pro primeiro ser X e não Y.  Cada universo que vem depois exigiria um motivo pra ter sido escolhido.

Godofredo: Pior que probabilidade nem seria algo utilizável nesse caso. Como não existe matéria antes do universo surgir, então a seleção de universos nem teria base. 

Ricardo: É, não consigo pensar em nenhum processo que aleatoriamente selecione os universos. Não dá pra matéria fazer isso, já que a configuração dos quarks é justamente o que tem que ser explicado.

William: Então o multiverso pode ser real que o problema continua. Algo fora do universo ou multiverso tem que selecionar o que existe. 

Godofredo: Isso só pode significar uma coisa: a explicação pra esse universo ou multiverso existir e não outro só pode ter a capacidade de escolher. Já que assim ela seria capaz de escolher o que vai existir.

Ricardo: E pra que a explicação escolheu esse universo e não outro?

Godofredo: Pergunta pra ela, ué, haha.

William: Nesse caso, o que causou o universo tem que ser algo eterno, necessário, muito poderoso, imaterial, fora do tempo e pensante. Isso me parece familiar...

Ricardo: Me parece algo familiar também.  deve ter algum erro então ai.

William: Não acho que tem erro nenhum aqui. Você não pode dizer outra vez que o raciocínio tá errado por não gostar Dele! 

Godofredo: "Dele" quem? Não vi o debate de vocês.

Chris: Só digamos que esse ultimo debate me fez refletir bastante, e esse vai te fazer também quando tu pensar melhor nisso tudo.

Godofredo: Entendo...

William: Me deu fome essa conversa e o Ricardo me deu vontade de comer sorvete. Bora comprar um?

Godofredo: Bora!

Chris: Que tal de maracuja? Tem uns baratos ali na esquina.

Ricardo: E o que explica você querer esse sorvete?

Chris: É bom, hehe. 


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